quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

[4] Nossos ancestrais os portugueses - Portugal


O viajante sábio nunca despreza seu próprio país
Carlo Goldoni


Tenho que confessar que quando saí do Brasil, apesar dos inúmeros estímulos históricos, não estava nos meus planos conhecer Portugal. A primeira razão para isso era que lá não poderia colocar em prática um dos principais objetivos dessa viagem, ou seja, exercitar o inglês e o espanhol, por motivos óbvios. A segunda era que Portugal não reuniria, pensava eu, atrativos suficientes para uma visita, como os demais países europeus, o que vinha confirmando com outros viajantes. No entanto, a medida que gastava tempo na Espanha, fui mudando de idéia. Estava tão perto e já que viajaria tanto pela Espanha, por que não, estando no sudoeste deste país, diminuir um pouco o tempo gasto nele, subindo para o norte por Portugal e então voltar a Espanha por Santiago de Compostela para finalmente ir em sentido leste passando por Bilbao, San Sebastian e, finalmente, Barcelona ? Conheceria assim não só Portugal como também interessantíssimas regiões da Espanha como a Galícia (Santiago) o País Basco (Bilbao) uma bela cidade praieira (San Sebastian) e, a imperdível Catalunha com uma das principais cidades da Espanha (Barcelona).

Com a frustrada passagem por Marrocos, esse roteiro ganhou força. Tive que ir até Sevilha novamente, onde tomei o ônibus para Lisboa. Pela janelinha ia observando aquela paisagem amarela, agora muito ansioso para conhecer a nação que povoou nosso imenso país. Depois de passar por inúmeras pequenas cidades, algo mudava no cenário. Português ! Na Europa ! Depois de mais de um mês longe do Brasil ! Nas pequenas lojas, nos postos de gasolina, na lanchonete em cujas proximidades o ônibus parou para que lanchássemos! Que sensação boa poder usar nossa língua novamente para pedir um simples café, ainda que a resposta viesse com o, agora ao vivo, sotaque lusitano.

Cheguei em Lisboa no entardecer de um domingo e logo tratei de localizar o albergue. Decidi tomar o metrô e lá dentro tive que abordar um casal para certificar-me de que estava na direção certa. Eram brasileiros. Após sair da estação tive que perguntar novamente para localizar a rua. Perguntei para um senhor que estava na porta de um bar. Era brasileiro. Cheguei ao albergue e registrava-me na recepção quando um homem se postou ao meu lado para perguntar algo ao recepcionista. Era brasileiro. Subi e coloquei minha mochila no quarto. Tomei um banho e desci para ver como era a televisão portuguesa. Todos assistindo televisão eram brasileiros. O programa era o Fantástico.
Estava mesmo em Portugal ou o ônibus teria entrado por um portal sem eu perceber e ido parar em alguma cidade brasileira ? E aquilo era só o começo, vim a perceber que os portugueses assistiam nossas novelas, escutavam nossas músicas, comiam algumas de nossas comidas ! Uma colonização às avessas ? Somos agora a metrópole cultural ?

Lisboa tem o seu charme. Capital de um dos países mais pobres da Europa, um dos últimos a ser anexado à Comunidade Econômica Européia, possui uma parte moderna sim, onde se realizou a Expo 98, mas todas as demais regiões parecem se conservar como centenas de anos atrás. Em muitos bairros, como o Alfama, permanecem as extensas escadinhas estreitas entre as casas em cujas janelas invariavelmente se encontram as donas-de-casa portuguesas conversando com suas vizinhas. Roupas penduradas nos varais também ajudam a complementar a paisagem nostálgica. Nestes bairros ainda é muito comum se ouvir o fado, música com poesia bastante melancólica. No bairro de Belém, além do Mosteiro dos Jerônimos onde se encontram restos de Camões, Fernando Pessoa e Vasco da Gama também está o monumento das descobertas, celebrando o desbravamento dos portugueses pelo mundo. Foi neste bairro também que provei os tradicionalíssimos pasteizinhos de Belém, que são feitos com nata, deliciosos.
É importante ressaltar que o centro de Lisboa foi totalmente desfigurado em 1755 por um terremoto. Toda a reconstrução foi financiada pela colônia Brasil através do ouro e diamante extraído de Minas Gerais. Estima-se que foram extraídos, em valores monetários, pasmem, mais de um trilhão de reais!

Fui também até Sintra, que está a uma hora de Lisboa. Patrimônio mundial da Unesco, possui um clima bastante agradável por se localizar em enormes serras. Costumava abrigar o palácio de verão dos reis portugueses. O albergue em que me hospedei era uma antiga fazenda no topo de uma serrra. O acesso não era fácil, mas compensava.

A terceira e última cidade portuguesa em que estive foi a imperdível Porto. A cidade em si já é um belo cartão-postal com o rio Douro cortando-a. Algumas pontes, e ruas tão características como as de Lisboa, tornam uma caminhada pela cidade bastante agradável. Não se pode deixar de citar também o vinho, cujo processo de produção foi aperfeiçoado pelos ingleses. Desde então milhares de garrafas são exportadas para todo o mundo. Tive a felicidade de experimentar e constatar que a fama tem fundamento.

Deu para ter uma boa idéia de Portugal, apesar de ter descoberto que há várias outras cidades que merecem ser visitadas. Fiquei feliz de ter tomado a decisão de ir até lá, não me arrependi nem um pouco. Parece que ainda enxergam o Brasil como o paraíso, e nutrem uma simpatia bastante especial pelos brasileiros, têm orgulho de terem descoberto nossa terra.


P.S.
Estava com minhas malas na Praça da República em Lisboa esperando dar a hora de ir para a rodoviária e tomar o ônibus para Porto, quando vi uma aglomeração em frente à uma televisão. Me aproximei e vi as cenas das torres gêmeas de Nova York desabando. Seria aquilo um alerta aos capitalistas de plantão ?

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